domingo, setembro 21, 2014

We´ll always keep Union Jack


Bem sei que o referendo era "lá com eles", mas sinto um certo alívio pela maioria dos escoceses - ou quem viva na Escócia há mais de um ano - ter votado não à independência. Não que o sim tivesse qualquer ilegitimidade e muito menos de ilegalidade - muito pelo contrário - nem que daí adviesse um grande mal, a fome dos escoceses ou uma tirania do Right Honourable Mr Alex Salmond (embora pudesse criar algum mal-estar entre a grande falange dos que não queriam a independência pura e simples). Mas permitiu que não se criasse um perigoso precedente para outras pulsões independentistas bem mais preocupantes, como a Catalunha, a Flandres, e, pior que tudo, a "Nova Rússia" em plena Ucrânia, sustentada pelas forças russas. não por acaso os separatistas da bacia do Don apoiavam avidamente o "sim" no referendo escocês. Os catalães também, pelo que levaram um balde de água fria. Por aí, talvez esta moda de nacionalismos emergentes tenha arrefecido um pouco (ainda que não tenha, nem pouco mais ou menos, acabado).

Depois, convém lembrar que, a despeito da imagem popular que se criou da Escócia - Wisky, gaitas de foles, kilts e monstros lacustres - a sua união com a Inglaterra para formar o Reino Unido, em 1707, resultou de uma decisão voluntária, apesar da oposição dos jacobitas, também por razões dinásticas e religiosas, e que a partir daí é que o poder britânico se ergueu, com a sua poderosa marinha, a revolução industrial e a expansão do império. A união dos reinos da Escócia e da Inglaterra mudou provavelmente o mundo, a geografia e a civilização. Os escoceses deram grande contributo, com os seus pensadores e inventores, as suas fábricas, os seus soldados. A Escócia é um dos berços do caminho de ferro e da indústria pesada, do pensamento iluminista e económico moderno. Ou seja, dos factores em que assentaram as bases do Império Britânico. Com o resultado do referendo, quaisquer que sejam as reivindicações concedidas apressadamente pelo governo de David Cameron, o Reino Unido manter-se-à uma potência com influência internacional, mesmo sem o império de outrora.

Mas o referendo permitiu redemonstrar que no Reino Unido, a democracia e a livre opinião mantêm-se sólidas. A forma como tudo se desenrolou, a campanha, os argumentos, a inteira liberdade com que cada parte procurou convencer os eleitores, mostrou mais uma vez que aquele velho conjunto de nações é a democracia mais antiga, e provavelmente a mais sólida, do Mundo. Compara-se com os patéticos "referendos" realizados na Crimeia e no leste da Ucrânia para se ver o que é um país livre e outro de cunho autoritário. Mesmo que nas redes sociais tenham aparecido alguns lunáticos a espalhar a ideia de que na Crimeia é que as coisas tinham funcionado e que no caso da Escócia tinha imperado "o medo e a chantagem". Provavelmente far-lhes-ia confusão a liberdade que se goza no Reino Unido, que lhes permitira tecer publicamente tais opiniões. Mas as credenciais britânicas nem precisavam de tanto. Quod erat demonstrandum. O exemplo das ilhas revelou que alguns bons velhos hábitos se mantiveram. Mas é bom saber que a Commonwealth não terá de se alargar para Norte. Antes assim. Até porque a Union Jack, talvez a mais conhecida das bandeiras do globo, e uma das mais bem concebidas, pode continuar a drapejar com a cruz de Santo André no fundo. Só isso seria motivo para votar não no referendo.

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