quarta-feira, março 07, 2012

Les Aventures de Tintin d´après Spielberg





Falei há dias dos filmes do ano passado. Um dos mais aguardados era a adaptação de Tintin ao grande ecrã por Steven Spielberg, e que teve uma nomeação discreta nos últimos Óscares, se excluirmos a rábula de Billy Crystal, disfarçado de Tintin numa cena da sua costumeira apresentação dos filmes.


Já vão uns tempos desde que o vi, mas voltei a recordá-lo a propósito dos filmes do ano passado. O grande projecto de Spielberg de levar ao grande ecrã uma adaptação do herói belga que se visse era um enorme desafio. A ideia já existia há mais de trinta anos, desde que o realizador americano conheceu Hergé, mas com a morte do desenhador belga o projecto ficou na gaveta durante décadas. Até que, depois de árduo trabalho e muito marketing, saltou para as telas.


Convenhamos que não é fácil adaptar BD ao cinema (a maioria das experiências é deplorável), quanto mais uma personagem com a carga mítica de Tintin, tão europeu, por americanos. Entendeu pegar-se em dois álbuns que se completam, O Segredo do Licorne e O Tesouro de Rachkam, o Vermelho (provavelmente os que conseguem aliar menor carga ideológica a maior dose de aventura), e acrescentar O Caranguejo das Tenazes de Ouro. Talvez fosse a abordagem mais correcta, por muito que gostasse de ver O Ceptro de Ottokar adaptado. Misturou-se tudo, criaram-se cenas novas, alterou-se o carácter de algumas personagens e filmou-se em motion-capture, com os actores a gesticular e a falar antes de serem revestidos pela imagem das personagens.

O resultado é satisfatório, confesso. As imagens da primeira parte no filme recriam uma Bruxelas fiel à época pós-Segunda Guerra (e aos álbuns), visível nos pequenos mercados de rua, na arquitectura e nos automóveis. Há ritmo, humor e aventura q.b. Os efeitos especiais são eficazes e a técnica encontrada para não pôr em cena personagens em carne e osso que eventualmente desvirtuassem os originais.


Mas à parte isto, devo dizer que vi mais o dedo de Spielberg que de Hergé. Até assisti a uma sessão dobrada em português e sem recurso a 3-D, para evitar uma visão mais "americanizada". Mas Spielberg, apesar de todos os esforços em contrário (ou não), estava quase sempre lá. Não sei se será propositado ou não. Mas Hergé parece ser o mero e longínquo inspirador das aventuras do filme e das suas personagens, como se tudo o resto fosse uma adaptação livre de um qualquer romance esquecido e jamais reeditado. Estamos a falar de um mundo muito europeu, que partiu de uma inspiração católica e desconfiada do Novo Mundo, e para um americano não será tão fácil de reproduzir. Apesar dos esforços, ainda não é o Tintin dos álbuns, se é que isso é possível. É um Tintin de Spielberg, e provavelmente continuará a ser em próximas sequelas. Hergé ficou nos quadradinhos. O encontro entre a banda desenhada e o cinema é das empresas mais difíceis e constrangedoras da existência humana dos últimos cem anos. Quando alguém o consegue, merece uma coroa de louros. Spielberg esteve lá perto, mas usou uns esboços já existentes para construir uma obra sua. Talvez se aproximasse mais se tivesse utilizado a banda sonora mais fiel às aventuras do repórter belga.




Já houve outras tentativas de levar Tintin ao cinema. Esta adaptação do Caranguejo das Tenazes de Ouro, de 1947, em bonecos de trapo, é a primeira, e provavelmente a mais terna.



Um comentário:

Freddy disse...

Vi o filme sem ser em 3D e tecnicamente está fantástico... Para um fanático do Tintin como sou, fiquei muito desiludido com o enredo e a passagem dos personagens para o filme, mais parecia um Indiana Jones. O filme claramente foi feito para quem não conhece muito bem a obra de Hergé cativando assim grandes audiências com cenas de acção completamente absurdas... Enfim...