terça-feira, agosto 24, 2010

A conquista de Arzila e a "Invenção da Glória"
24 de Agosto é uma data fértil em acontecimentos. Uma delas foi a conquista de Arzila, em 1471, etapa relevante do plano expansionista de D. Afonso V por terras mouras. O Africano quis que o feito militar ficasse registado para a posteridade e encomendou às oficinas flamengas de Tournai (hoje na Valónia) um conjunto monumental de tapeçarias que retratassem os vários momentos da tomada da cidade.

Assim sucedeu, mas por razões misteriosas as tapeçarias foram parar ao Ducado de Infantado, que os cedeu posteriormente à Colegiada de Pastrana, onde se mantiveram durante séculos. A grande questão é que a "transferência" não se deu durante o reinado da dinastia dos Habsburgos, entre 1580 e 1640, mas sim na primeira metade do século XVI, e não consta que fosse qualquer oferenda de casamento a uma qualquer infanta castelhana. Até hoje, não se percebe como é que as tapeçarias foram parar à colegiada da pequena cidade perdida no meio de Castela.

Nelas se retratam o desembarque atribulado, o cerco a Arzila e a tomada da cidade. Em todas, o Africano é representado em destaque, com uma armadura reluzente, distinguindo-se também o Príncipe D. João. Numa quarta tapeçaria representa-se ainda a tomada pacífica de Tânger, cuja anterior tentativa de conquista anos antes redundara num fracasso e custara a liberdade a D. Fernando, o Infante Santo.

Depois de séculos em Espanha, as quatro tapeçarias estão expostas do Museu Nacional de Arte antiga, em Lisboa. Impressionam pela sua monumentalidade e minúcia, retratando todos os passos dos acontecimentos da época. Os Painéis de São Vicente foram temporariamente retirados do seu lugar habitual e colocados mais à frente, para completar o conjunto. A exposição, intitulada "D. Afonso V e a Invenção da Glória", pode ser vista nas Janelas Verdes até 12 de Setembro. E garanto, vale imenso a pena ver aqueles lindíssimos e imponentes tecidos, comparáveis às célebres tapeçarias de Bayeux, que depois de tanto tempo encerrados num obscuro mosteiro espanhol, nos relatam com grande pormenor e arte esse período de conquistas que iniciou a época de ouro de Portugal

sábado, agosto 21, 2010

Cento e dez anos sem Eça

No meio da autêntica silly season, e com uma festa de centenário pelo meio (não, não era o da república), valham os blogues para nos recordar as grandes efemérides. Por acaso não tenho nenhum Eça à mão, mas estou a ver ali um Machado de Assis a espreitar por baixo do Ipsilon de ontem. Dadas as matérias e a contemporaneidade, tenho esperança que seja suficiente para afastar a vergonha.


segunda-feira, agosto 09, 2010

Um submarino vogando no Tejo


Os novos submarinos comprados ao consórcio alemão HDW podem ser de utilidade escassa ou duvidosa, podem ser caros e as suas contrapartidas um logro, podem ser excessivos para as funções a que se destinam, pode haver sucedâneos mais eficazes e mais económicos, mas uma coisa é certa: é (ao menos o primeiro chegar, o Tridente) um autêntico espectáculo visual, vê-lo perfilado navegando face ao Terreiro do Paço. Uma imagem de elegância, pompa naval e circunstância, como agora raramente se vê em Portugal. Os mil milhões de euros sempre deram para uma boa fotografia.

quarta-feira, agosto 04, 2010

Saramago só depois
As homenagens artísticas tanto podem ser legítimas e compreensíveis como se podem revestir de um oportunismo com intenções várias, a começar pelas ideológicas. A recente proposta da
CDU de de dar o nome o nome de Saramago a uma rua do Porto encaixa-se nas duas. Já a sua recusa pela câmara tanto se pode justificar por ressabiamento político como por sensatez numa altura em que a morte do escritor é muito recente, e dá azo a qualquer aproveitamento ideológico e a análise sem a devida distância.
Não me aquece nem me arrefece que Saramago tenha uma artéria com o seu nome no município, desde que seja um novo arruamento e não uma rua central, como os seus camaradas fizeram por breves dias, quando em pleno PREC trocaram os nomes das Ruas Júlio Dinis e D. Manuel II por rua Catarina Eufémia e rua...José Estaline (toponímia que como é óbvio, não colou). Também acho que a desculpa da câmara para não dar esse nome, em "apenas aceitar nomes de cidadãos com ligação directa ao Porto para ruas da cidade", escudando-se numa mais que discutível e limitativa decisão da Comissão de Toponímia, é patética e apenas ridiculariza a cidade. A seguir esse critério,a rua de Camões teria de mudar de nome.
Mas se tomarmos em devida conta a decisão da comissão, conjugada com o súbito entusiasmo da CDU na atribuição de novos nomes de ruas, é caso para se perguntar porque é que ninguém propôs os nomes de Sophia de Mello Breyner e de Eugénio de Andrade? Não só tiveram uma ligação directa com o Porto como foram vultos literários ilustres. Curiosamente, os seus nomes não constam da toponímia portuense, ao passo que noutros concelhos, como Lisboa (mais precisamente o miradouro da Graça), ou Matosinhos, já lá estão. Assim, permita-se algum hiato de tempo após a morte de Saramago, dê-se-lhe a devida distância, e já agora, altere-se a bizarra decisão da Comissão de Toponímia. Entretanto, vamos imortalizar Sophia e Eugénio no Porto, como eles merecem. E depois, mas só depois, é que o nome do homem de Azinhaga poderá ser tido na devida conta.