terça-feira, junho 15, 2010

As medidas para a desertificação



Depois das promessas iniciais, Isabel Alçada já está a descarrilar. As decisões dos últimos tempos foram valentes tiros no pé, um a seguir ao outro. tivemos primeiro a história da passagem dos alunos do oitavo ano para o décimo mediante alguns exames, que é um belíssimo desincentivo às faltas e ao copianço. Depois, a decisão, que já começou a ser concretizada, de fechar todas as escolas com menos de vinte alunos. Parece que tais situações são "criminosas" e causa de "abandono", "exclusão" e "insucesso escolar". Não se percebe bem porquê, excepto se pensarmos nos critérios habituais do socratismo.


A desculpa do "insucesso escolar" é apenas areia para os olhos. As verdadeiras razões são outras. Uma é a de economia de recursos, humanos e materiais. Até se perceberia caso se tratasse de escolas com menos de cinco ou dez alunos, mas nunca de vinte. A outra razão prende-se com o fecho de inúmeras estruturas locais. Para além das razões de gestão, há a ideia não confessada, mas explícita, de se acabar com as aldeias e o mundo rural. É quase impossível encontrar uma aldeia com mais de vinte crianças em idade escolar. Os propósitos de José Sócrates são os de "modernizar o país", como ele afincadamente repete. Ligada a esta ideia está a de vida urbana, que obviamente exclui toda e qualquer marca de ruralidade, considerada "atrasada", "ignorante" e "medieval". Acelerou-se a extinção de serviços de saúde, de instrução, etc, com os mesmos argumentos de "racionalização de meios". Já se fala em extinção de comarcas e até em fusão de concelhos. A desertificação do interior, iniciada nos anos sessenta, está em marcha.




Como acontece a muita gente que nasceu nesse interior, Sócrates tenta camuflar o melhor que pode as suas origens, pretendendo passar por homem moderno, cosmopolita, desempoeirado e sofisticado. Essa preocupação em atirá-las para as costas é visível na sua obsessão com as novas tecnologias, cujo corolário é o famoso Magalhães.


Outra marca é este afã anti-rural, que tenta disfarçar com a construção de meia dúzia de estradas. Mas todos sabem no que resultarão medidas como as do fecho destas escolas: as crianças terão de se levantar ainda mais cedo para ir para a vila e a pequena cidade, ganharão a ideia de que viver na aldeia não é "moderno" (ainda para mais quando nelas impera a velhice, esse transtorno dos tempos contemporâneos), e forçosamente abandonarão a aldeia, com os pais ou logo que tenham de trabalhar. Os pequenos povoados envelhecerão e desaparecerão. A terra ficará deserta, semeada de ruínas esquecidas, charnecas, mato e montes, entrecortadas por estradas entre uma e outra cidade. A agricultura tenderá a ser ainda mais marginalizada, excepto algumas culturas específicas, como o vinho, ou as hortas comunitárias, ou ainda os campos de golfe dos resorts turísticos em redor das barragens resultantes do respectivo plano nacional, que afundará mais campos e estruturas centenárias como a Linha do Tua. Assim se realizará a tão ansiada "modernização do país", que nos aproximará fatalmente, como nos tentam convencer, dos "índices de desenvolvimento humano" dos "países civilizados". Mas quando isso acontecer, e os subúrbios estiverem insuportáveis e incomportáveis, as pessoas lembrar-se-ão que precisam de produtos da terra para comer, e de espaço para viver. Nessa altura, José Sócrates já não governará Portugal.


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