sexta-feira, janeiro 07, 2005

In memorian - o rosto da Palestina (post em atraso)

Este é um post que estava em banho-maria desde há dois meses, e que por esquecimento, inércia, impossibilidade temporária ou simples preguiça blogoesférica ainda não tinha publicado. é certo que a morte de Arafat já lá vai, mas aproximam-se as eleições palestinianas, que porão Mazen ou Bargouthi no poder, e que ditarão parte do futuro do Médio Oriente. Por isso mesmo, convém recordar o desparecimento do homem que despoletou estes movimentos. Até porque a situação no terreno está longe de estar mais calma.

Yasser Arafat morreu enfim, depois de uma data de falsas declarações obituárias. Choveram logo as habituais condolências, lamentos, regozijos. E expectativas quanto ao futuro do Médio-oriente, agora sem uma das suas mais marcantes figuras das últimas décadas.
Desde pequeno que me lembro de ver o homem e o seu kaffyeh, como se de um apêndice se se tratasse -para além dos indispensáveis óculos escuros (que entretanto pôs de lado), a tal ponto que cheguei a pensar que fosse cego. O nome Arafat é pois um dos marcos da política internacional mais longevos, pelo menos para a minha pessoa.
Convém desde já que fique clara uma coisa: o chairman palestiniano era intrasigente, obcecado, e porventura ultrapassado, mas não creio que fosse "o obstáculo" à paz. Há que lembrar que a agonia dos acordos de Oslo iniciou-se com o assasinato de Rabin por um radical judeu, a que se seguiram o governo do truculento "Bibi" Netanyahu, os ambíguos desígnios de Barak, que prometeu um estado palestiniano mas não cessou a construção de colonatos, o passeio de Sharon no pátio das Mesquitas, que desencadeou a 2ª Intifada, e o cerco de Arafat no seu QG em escombros.
Daí lhe exigiram o controlo do terrorismo e a convocação de eleições. Seriam justas exigência se outras fossem as condições de "Abu Ammar", ameaçado de morte por Israel. A verdade, porém, é que nenhum dos intervinientes se portou à altura: nem Arafat, com posições de animal acossado e a fortuna que juntou; nem Sharon, que jamais demonstrou real interesse numa paz mútua, e muito menos Bush, pouco interessado em conceder a mínima condição aos palestinianos.
Agora, um dos lados do triângulo, perto do qual vogam outras figuras duvidosas, desapareceu; o futuro é uma incógnita, não se antevendo melhor nem pior numa zona que gritantemente precisa de paz. E, apesar dos defeitos que se lhe possam apontar, é justo reconhecer Arafat como o rosto do nacionalismo palestiniano, tal como Ben Gurion o era para Israel, ou Nasser para o Egipto. Todos eles cometeram erros e tiveram as suas fases mais obscuras. Mas tiveram sempre como maior objectivo das suas existências a libertação e/ou completa autonomia dos seus povos. Arafat cabe dentro destes pressupostos, já que toda a sua vida, mesmo que por caminhos perigosos ou errados, foi dedicada ao seu povo, até ao fim. Por isso mesmo merecerá o repouso e a admiração dos seus, seja na Muqata ou em Jerusalém.


Um comentário:

mfc disse...

Um combatente não morre enquanto a sua causa não for derrotada.
E a dele vencerá, tal como ele.